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Sobre o Projeto

Desafios Científicos


A produção de etanol de cana-de-açúcar pode ser esquematizada através do diagrama apresentado na Figura 1.



Figura 1. Insumos, Fatores de Produção, Restrições e Impactos envolvidos na Produção de Álcool.

No topo da Figura estão representados fatores determinantes da produção de cana, açúcar, álcool e energia, tais como:

    - Condições climáticas favoráveis para o desenvolvimento da cana-de-açúcar com o menor risco climático possível (pelo menos 80% de chance de sucesso, ou, quatro safras bem sucedidas a cada cinco);
    - Disponibilidade de terras para o plantio da cana;
    - Tecnologia agrícola relacionada com a produção no campo, tal como variedades produtivas e adaptadas, maquinaria agrícola, produtos químicos, previsão de tempo e clima, fertilizantes e monitoramento agrometeorológico;
    - Tecnologia industrial, responsável pela geração dos vários produtos (açúcar, álcool, energia e química) a partir da cana colhida;
    - Distribuição populacional - é importante tanto como fonte de mão-de-obra para o campo e a indústria quanto como na definição do mercado consumidor que pode delimitar as áreas de plantio e industrialização da cana-de-açúcar e na relação com a saúde humana;
    - Infra-estrutura utilizada tanto na produção agrícola quanto na industrial, tais como, estradas, portos, armazéns, indústrias e telecomunicações;
    - Política – pode favorecer ou dificultar o desenvolvimento da produção, de acordo com a influência exercida nos fatores determinantes, a menos do climático;
    - Recursos financeiros – também afeta os demais fatores, a menos do climático, e tem uma relação muito estreita com o fator político.

Os quatro símbolos à direita da Figura representam os setores que podem ser impactados pelo sistema de produção agro-industrial, tais como: meio-ambiente, dinâmica populacional, segurança alimentar e nutricional e a saúde humana. Ressalta-se que o dimensionamento dos impactos sobre estes setores pode servir para definir os limites ou restrições ao desenvolvimento do sistema de produção.

A geração dos cenários de produção do álcool de cana será baseada em uma metodologia bastante desenvolvida na Unicamp, juntamente com outras instituições de pesquisa parceiras, desde 1996, no Programa de Zoneamento de Riscos Climáticos do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), conforme descrito por Assad et al. (2004, 2007a, 2007b, 2008), Caramori et al. (2006), Pinto et al. (2007, 2008), Zullo Jr et al, (2006, 2008). O diferencial da metodologia proposta, e descrita na Figura 2, em relação à que é normalmente utilizada, será a incorporação de outras análises e parâmetros que não são normalmente considerados neste Programa, mas que são fundamentais para o trabalho a ser desenvolvido. É importante citar alguns aspectos relevantes desta metodologia que são de grande interesse para o Projeto e que justificam a sua utilização:

    - Utilização de técnicas de geoprocessamento, que viabiliza a realização de análises espaciais através de cartas e mapas gerados no transcorrer do seu desenvolvimento e que são de grande utilidade. A escala de trabalho deverá ser de, no mínimo, 1:1.000.000;
    - Descrição de parâmetros qualitativos através de valores quantitativos a serem utilizados nas análises e nos cruzamentos com outros parâmetros;
    - Desenvolvimento orientado para a implementação de políticas públicas, que é um dos objetivos principais do Programa de Mudanças Climáticas da FAPESP e deste Projeto, em particular;
    - Viabilidade para integração das diversas áreas do conhecimento envolvidas no Projeto, respeitando-se as individualidades e características de cada uma delas.

Cada etapa da metodologia poderá ser desenvolvida de forma independente, mas deverá acompanhar sempre o andamento das demais, pois o estabelecimento de uma inter-relação efetiva entre os vários parâmetros envolvidos na produção de etanol é um dos principais desafios científicos do Projeto. Desse modo, acredita-se que será possível responder aos grandes desafios apresentados como objetivos específicos do Projeto, no Item 6, e, consequentemente, alcançar o objetivo geral, apresentado no item 3. Deverão ser elaborados cenários de produção para três períodos distintos: 2025 (curto prazo), 2050 (médio prazo) e 2075 (longo prazo). Estes prazos estão bem adequados, considerando tratar-se de uma cultura com quase 500 anos de história no país e uma perspectiva de evolução promissora para as próximas décadas. Poderão ser elaborados cenários para o período atual, com o objetivo de aferir a metodologia durante o seu desenvolvimento através da comparação dos resultados obtidos por ela com os dados existentes atualmente. Os cenários serão feitos para o estado de São Paulo, por ser a principal região de produção de cana, açúcar e álcool do país, e uma das principais do mundo. Esta análise poderá englobar o norte do estado do Paraná e o sul de Minas Gerais, pois são regiões de expansão vizinhas de São Paulo. Deverá ser escolhida uma segunda área-teste, correspondente a uma região de expansão, tal como um dos estados do Centro-Oeste, ou uma região que seja tradicional no cultivo da cana, mas não possua o mesmo nível de desenvolvimento do Sudeste, tais como ocorre em alguns estados do Nordeste brasileiro.


Figura 2. Esquema da metodologia a ser utilizada para a elaboração dos cenários de produção de Etanol.

A primeira parte da metodologia, denominada de Análise Climática, corresponde à definição das áreas com risco climático adequado para a produção da cana-de-açúcar, sendo baseada nas características edafoclimáticas da cana-de-açúcar e nas condições climáticas (normalmente na temperatura e na chuva) do período em análise. No caso da simulação do período atual, serão consideradas as características médias das principais variedades de cana-de-açúcar cultivadas no Brasil e utilizadas séries históricas de dados de chuva e temperatura disponíveis, por exemplo, no Sistema de Monitoramento Agrometeorológico Agritempo (http://www.agritempo.gov.br). As características edafoclimáticas da cana-de-açúcar, para os períodos futuros, serão determinadas com o apoio dos especialistas em melhoramento vegetal e engenharia genética participantes do Projeto. A definição dos cenários climáticos futuros é um dos objetivos específicos do Projeto e serão escolhidos pelos membros da equipe técnica especialistas em climatologia. Serão avaliados os modelos de mudanças climáticas propostos, ao longo do desenvolvimento do Projeto, pelos institutos de previsão climática do Brasil e exterior. Pretende-se escolher de três a cinco modelos distintos que sejam mais adequados para o Brasil e que tenham resolução espacial melhor que os utilizados nos trabalhos já realizados. O modelo a ser desenvolvido no âmbito do programa de mudanças climáticas da FAPESP deverá ser um dos modelos utilizados, se possível.

A comparação entre os zoneamentos de riscos climáticos gerados para períodos diferentes permitirá atender um dos objetivos específicos do projeto que é o aprofundamento da avaliação do impacto das mudanças climáticas na agricultura, principalmente na cultura da cana-de-açúcar. Ressalta-se que a metodologia de zoneamento agrícola utilizada atualmente no Ministério da Agricultura estabelece que o risco de sucesso deva ser igual ou superior a 80%, ou seja, deve haver pelo menos quatro safras bem sucedidas a cada cinco cultivadas.

A segunda parte da metodologia, denominada de Análise Agrícola, tem o objetivo principal de definir as áreas potenciais de plantio da cana-de-açúcar, com base nos seguintes parâmetros principais:

    - Tecnologia agrícola empregada no setor: relaciona-se, por exemplo, à fertilidade dos solos, ao relevo adequado para mecanização e à disponibilidade de variedades produtivas e adequadas para cada região de interesse;
    - Uso e ocupação das terras: dimensões das áreas urbanas, áreas utilizadas por outras culturas e de preservação ambiental;
    - Projeção e distribuição populacional: necessária para definir o potencial da mão-de-obra disponível para o setor, o tamanho do mercado consumidor e a necessidade de alimentos; e
    - Políticas relacionadas com o setor: podem incentivar ou frear o seu desenvolvimento.

Salienta-se que os cenários climáticos também são importantes nesta etapa da metodologia, pois podem influenciar diretamente os demais parâmetros, razão pela qual aparece explicitamente no diagrama da Figura 2.

O mapeamento do uso e ocupação atual das terras será básico para as estimativas futuras deste parâmetro a serem realizadas a partir das previsões de mudanças climáticas. Poderão ser utilizados levantamentos feitos recentemente, desde que disponíveis em formato digital. Outra alternativa, serão as séries de imagens de satélites de baixa resolução espacial, como o AVHRR/NOAA, disponíveis, por exemplo, na Unicamp desde abril de 1995. O mapeamento das áreas urbanas poderá ser feito, também, através das imagens dos satélites americanas da série DMSP que são bastante adequadas para esta finalidade.

A terceira etapa da metodologia consiste em cruzar os resultados das etapas anteriores (Climática e Ambiental), visando definir as áreas com condições edafoclimáticas, ambientais e agrícolas favoráveis ao desenvolvimento da cana-de-açúcar. A quarta etapa da metodologia, denominada de Análise Industrial, tem o objetivo de determinar o potencial efetivo de produção de álcool etanol com base nos seguintes parâmetros principais:

    - Tecnologia industrial para a produção de etanol a partir da cana-de-açúcar;
    - Infra-estrutura (rodovias, ferrovias, hidrovias, armazéns e portos) para geração e distribuição das produções agrícola e industrial. Ressalta-se que este parâmetro, junto com a distribuição do mercado consumidor, é estratégico na definição do alcance espacial das produções (se locais, regionais, nacionais ou internacionais, isto é, para exportação);
    - Disponibilidade de recursos financeiros para investimentos (infra-estrutura e instalação de plantas industriais, por exemplo);
    - Projeção e distribuição populacional (necessária para avaliar as novas demandas relativas à infra-estrutura urbana, como saneamento, serviços básicos e sistema viário, em um cenário de crescimento populacional acelerado das cidades de médio e grande porte); e
    - Políticas relacionadas com o setor (que podem incentivar ou dificultar o seu desenvolvimento).

A produção de etanol estimada deste modo será, portanto, dependente das definições feitas (com base em dados, considerações, análises, restrições e hipóteses) para cada um dos vários parâmetros selecionados. Quanto mais embasadas e criteriosas forem estas definições, mais precisas e úteis deverão ser as estimativas feitas. A partir de definições adequadas dos vários parâmetros envolvidos no trabalho, poderá ser estimada, por exemplo, qual a produção de etanol numa situação de baixo impacto ambiental, sem risco de insegurança alimentar e nutricional, com capital disponível para os investimentos necessários e políticas favoráveis. Poderá ser estimada, também, qual a produção caso não haja limites nem controles para a instalação de novos plantios de cana-de-açúcar em substituição a áreas ocupadas por outras culturas (principalmente as alimentares) ou matas. No caso das definições dos valores que poderão ser assumidos por cada parâmetro, deverão ser escolhidos os valores extremos (máximo e mínimo) possíveis para cada um deles. No caso do fator político, por exemplo, pode-se estabelecer um cenário com condições totalmente favoráveis para o setor (com incentivos financeiros e sem controle rigoroso para o plantio da cana-de-açúcar) e outro completamente desfavorável (com controle rigoroso das áreas plantadas e pouca disponibilidade de recursos financeiros para os investimentos necessários). Estes cenários, principalmente no caso da política, deverão ser baseados nas conjunturas nacionais e internacionais identificadas durante o desenvolvimento do projeto para que eles sejam os mais reais possíveis. Estratégia semelhante será adotada para os parâmetros de caráter mais técnico, como as tecnologias agrícola e industrial, que são dinâmicas e podem mudar significativamente de um período para outro de análise. Trabalhos como o de Scandiffio (2005) e Robertson et al. (2008), que fizeram um diagnóstico do álcool combustível no Brasil e no mundo, serão de grande utilidade neste caso.

Como exemplo de política favorável à adaptação das produções de cana, açúcar e álcool às mudanças climáticas, pode-se citar as metas de consumo de combustível renovável estabelecidas em alguns países. A União Européia, por exemplo, pretende que, em 2020, 10% dos combustíveis utilizados no transporte sejam de fontes renováveis. Os Estados Unidos estabeleceram, em 2007, que a produção de etanol celulósico seja de 16 bilhões de galões por ano em 2022. Como exemplo de outros fatores neste mesmo contexto tem-se: a exploração das reservas de petróleo e gás descobertas recentemente no Brasil, a disseminação dos carros “flex-fuel”, o crescimento da economia e das rendas per capita nacional e mundial, o aumento da utilização de outras fontes de energia na frota veicular (como energia elétrica, gás natural e células de hidrogênio) e a implementação efetiva dos protocolos internacionais de redução das emissões dos gases de efeito estufa.

Com relação aos impactos, no caso específico do nível de segurança alimentar e nutricional (SAN), a análise será feita, especialmente, em relação às dimensões de disponibilidade e estabilidade, nos níveis micro, meso e macro sócio-organizacionais (Gross et al., 2000 e Ministério da Saúde, 2006). Será analisada a relação entre a expansão da cana-de-açúcar e a produção de culturas alimentícias em São Paulo. Serão obtidos dados históricos de área plantada, produção e produtividade de culturas agrícolas como o café, citrus, arroz, feijão, milho e hortaliças junto a instituições como IBGE, Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo e Cooperativas Agrícolas, por exemplo. Se houver realmente uma relação inversamente proporcional significativa entre a produção de alimentos e a produção de etanol, será preciso definir formas de minimizar esta limitação à expansão do setor canavieiro através, por exemplo, do incentivo ao desenvolvimento de técnicas de produção de alimentos mais eficientes, da redução do desperdício, do melhor aproveitamento dos alimentos e do estabelecimento de políticas públicas que reduzam o risco de insegurança alimentar. A grande colaboração do Projeto, neste caso, será fornecer subsídios para um dos grandes desafios relacionados à expansão da cana-de-açúcar que é o risco de insegurança alimentar.

No caso das questões relacionadas à inovação e adaptação tecnológica, pretende-se realizar um conjunto de estudos que irão dar sustentação a uma base de conhecimentos sobre a influência que a tecnologia pode ter na maior adaptação da sociedade aos impactos ambientais. Para isto serão desenvolvidas as seguintes atividades:

   - Análise da geração e difusão de previsões meteorológicas da Embrapa entre os produtores rurais;
   - Estudos de prospecção tecnológica, relacionados com o desenvolvimento de variedades de culturas selecionadas (cana, café, soja, laranja e milho) que sejam capazes de se adaptarem às mudanças climáticas previstas para este século (temperaturas mais elevadas, aumento de ocorrência de fenômenos extremos e alteração na distribuição das chuvas).
   - Levantamento dos custos requeridos pela mudança tecnológica;
   - Análise das necessidades e dos instrumentos de política de ciência, tecnologia e inovação orientados para a inovação adaptativa.

Com referência às análises que envolvam as questões populacionais, a abordagem a ser utilizada terá como objetivo, de um lado, as análises substantivas sobre a interface da dinâmica demográfica nos novos cenários advindos da expansão da cultura da cana de açúcar e da produção de açúcar e álcool; de outro lado, a construção de indicadores sócio-demográficos relevantes para a elaboração de modelos explicativos e preditivos acerca dos fenômenos envolvidos nos impactos das atividades canavieiras e da produção e consumo do etanol. As atividades serão baseadas nos trabalhos de Ahlburg & Lutz (1999), Arriaga (2001), Baeninger (2005, 2008), Bell et al. (1997), Bilsborrow (1996), Brito & Carvalho (2006), Cano (1996), Celade (1994), Cunha & Baeninger (2005), Domenach & Picouet (1990), Ebanks (1993), Faria (1991), Hakkert & Martine (2006), Jannuzzi (2000, 2007), Lattes (1998), Pacheco (1998), Namboodiri (1972), Villa & Rodriguez (1994) e Zitter & Shryock (1964).

No caso das atividades de divulgação científica, serão desenvolvidas interfaces entre o Projeto e a sociedade, a escola e a imprensa, visando divulgar os conhecimentos científicos relevantes para o cotidiano, com disseminação e cobertura nacional, considerando as especificidades, as necessidades e a importância do tema das mudanças climáticas. A interface com a sociedade ocorrerá através das páginas do Labjor (em http://www.labjor.unicamp.br), da Cocen (em http://www.cocen.unicamp.br) e de uma página a ser desenvolvida especificamente para o Projeto. Estas páginas divulgarão o andamento das principais atividades de pesquisa do Projeto e apresentarão notícias atualizadas de assuntos relacionados a ele, utilizando uma linguagem adequada para que o público leigo tenha acesso e compreenda o assunto, considerando a percepção que ele tem da ciência (Vogt & Polino, 2003, Sterman, 2008). Serão veiculados, também, vídeos curtos (com 3 a 5 minutos de duração) sobre a área em questão, mostrando entrevistas com profissionais conceituados, pesquisas em andamento e resultados de experimentos, entre outros. Estes vídeos pretendem mostrar, de maneira dinâmica, a forma de atuação na área, ressaltando pesquisas atualizadas e de interesse mundial.

A interface com a escola será feita através de material elaborado especialmente para os professores dos vários níveis escolares utilizarem nas salas de aula e bibliotecas. Este material ficará à disposição nas mesmas páginas utilizadas na interface com a sociedade. Com isto, pretende-se formar uma rede de comunicação educacional, que possibilite aos educadores a discussão do tema das mudanças climáticas, através de materiais científicos de fácil compreensão e provenientes de fonte segura.

A interface com a imprensa será feita através do envio de releases para os veículos de comunicação com sugestões de pautas sobre temas relacionados às mudanças climáticas e às atividades em desenvolvimento no Projeto. Além das sugestões, serão enviados materiais e informações adicionais solicitadas pela imprensa, atuando, também, como fonte de referência para a produção de matérias jornalísticas. Pretende-se, também, organizar um curso de extensão ou especialização voltado para o entendimento, compreensão e divulgação especificamente das mudanças climáticas, que possa produzir uma divulgação mais eficiente na área. Pretende-se, com isso, que as pessoas tenham acesso frequente e rápido a informações recentes e de qualidade sobre o tema das mudanças climáticas, tornando-se capazes de formar opinião própria, julgar com coerência e tomar decisões que transformem os brasileiros em atores, e não simples coadjuvantes, na construção de uma sociedade mais democrática e tolerante às diferenças.

Logotipo do Programa Fapesp de Mudanças Climáticas Processo N.08/58160-5 | Período: 01/12/2010 a 30/11/2014