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12/03/2013

Expansão da cana-de-açúcar no Brasil

Marcos Rogério Pereira

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Números e dados estatísticos do setor sucroalcooleiro mostram conquistas e desenvolvimento econômico ao longo do tempo. Inovações tecnológicas e, sobretudo, ganhos de produtividade e eficiência no setor fazem do Brasil um dos principais produtores de biocombustíveis do mundo. No entanto, historicamente, o fenômeno da expansão da cana-de-açúcar no país sempre se mostrou ameaçador. Expulsão ou extermínio de populações indígenas, exploração de trabalho escravo, degradação do meio ambiente, implantação de monocultura, sempre associada a latifúndios, além de danos à saúde da população, estão entre as distorções.

De acordo com Pedro Ramos, professor do Instituto de Economia da Unicamp e especialista nas áreas de economias agrária e recursos naturais, a expansão da indústria canavieira no país se faz com efeitos colaterais perversos.
Segundo o docente, a indústria canavieira se expandiu muito no Brasil nos últimos anos. Não só em São Paulo como também em muitas áreas da região Centro-Oeste, notadamente em Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, além do estado do Tocantins.

Para se expandir, a indústria canavieira aproveitou os latifúndios existentes nessas regiões, ocupando, expulsando e substituindo outras culturas alimentares. A cana se lançou sobre áreas predominantemente de pecuária, cultivo da soja, do milho etc.

O professor aponta ainda que um dos aspectos negativos desse avanço é a compra de terras feita por capital estrangeiro, o que está em discussão no Congresso Nacional, pois coloca em risco a soberania sobre a propriedade do solo nacional. O tema é também objeto de trabalhos publicados pela FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura). Outro aspecto, aponta o docente, trata da falta de compromisso do setor sucroalcooleiro em garantir o abastecimento de álcool com preços que sejam minimamente competitivos. Ainda que seja difícil competir com o preço da gasolina, reconhece o professor, principalmente em razão de a Petrobrás possuir gasolina em excesso e do preço praticado pelo mercado internacional de petróleo, o setor não garante o abastecimento interno.

Um exemplo recente é o uso do carro flex, desenvolvido para ser abastecido com álcool e gasolina, independentemente da proporção, mas que é abastecido preferencialmente com gasolina pelo consumidor. Nesse sentido, o professor diz que a agroindústria canavieira no Brasil precisa de uma regulamentação mais clara e consistente e que equacione os problemas de abastecimento, meio ambiente, saúde e o trabalho dos cortadores de cana-de-açúcar, conhecidos como boias-frias.

Na opinião do professor, a expansão para o Centro-Oeste, especificamente, também se mostrou problemática porque contou com financiamento a juros subsidiados do BNDES para a mecanização integral da colheita e acarreta enorme redução na criação de ocupação para os trabalhadores não-qualificados, embora crie poucos empregos para alguns qualificados, sendo que aqueles ficam sem alternativas de renda. Isto é complicado principalmente, lembra Ramos, porque o setor tem contado com apoio dos governos da região (destaque para o caso de Goiás), com isenção ou abatimento de impostos (ICMS), construção de infraestrutura etc.

Avanço da cana sobre áreas de matas

Em relação à questão do avanço da cana sobre áreas de matas, de florestas, o professor é contundente. “Precisa ter regulamentação".

Com mais de 30 anos de experiência em economia agrícola, o professor diz que o grande problema, nesse caso, é o governo conseguir controlar, fiscalizar e, principalmente, dar uma resposta à sociedade se realmente houve desmatamento ou não. "Ocorre que alguns produtores ou usineiros adotam práticas nada recomendáveis de escamoteamento dos impactos ambientais. Uma delas é adentrar em áreas de florestas, com máquinas pesadas, muitas vezes adquiridas com dinheiro do BNDES, e derrubá-las. Enterram as árvores e as plantas em enormes buracos como tentativa de esconder o desmatamento. Essa prática também é recorrente no estado de São Paulo, principal produtor de cana do país", afirma o pesquisador.

O problema do desmatamento na Região Centro-Oeste, segundo o docente, torna-se ainda mais dramático. A região é considerada muito importante para os rios brasileiros. O professor explica que parte dos rios que nascem e integram essa região, por exemplo, indo para o Nordeste e vindo para o Sudeste, tem seus nascedouros no Centro-Oeste. Ademais, o Cerrado, predominante no Centro-Oeste, já foi muito afetado pelo avanço da pecuária, depois pela soja e agora pela cana-de-açúcar e assim sucessivamente. "Não é simples conectar a agressão ambiental diretamente com essa ou aquela cultura, mas a prática utilizada por parte dos produtores da indústria canavieira no Brasil não costuma respeitar o problema ambiental, principalmente, em relação ao desmatamento e à poluição dos rios".

De acordo com o professor, no Pantanal só não tem usinas de álcool porque morreu gente em defesa do meio ambiente. O professor lembra a morte de um senhor, nos anos 1980, que lutou contra a instalação de usinas na região do Pantanal e, em 2005, a morte do ambientalista Francisco Anselmo de Barros, que ateou fogo no próprio corpo em protesto realizado em defesa da preservação do Pantanal e contra a instalação de usinas de álcool na bacia do Alto Paraguai.

Além do problema do desmatamento, outra questão ambiental grave ocasionada pela instalação de destilarias na região pantaneira, segundo Ramos, se dá pela produção do vinhoto – resíduo que sobra depois da destilação do caldo da cana para obtenção do etanol. Para cada litro de álcool produzido, são gerados doze litros de vinhoto. Quando lançado nos rios, constitui uma séria fonte de contaminação da água. Para o professor, nada justifica a instalação de usinas em regiões como o Pantanal.

Crescimento a qualquer custo

Para o professor, não existe crescimento a qualquer custo. No Sudeste, por exemplo, está o maior reservatório de água-doce do mundo – o Aquífero Guarani. Na região de Ribeirão Preto, uma das principais produtoras de cana do estado de São Paulo, o reservatório já foi afetado pela fertirrigação, técnica utilizada para aplicação de fertilizantes através da água de irrigação, e os resíduos contaminadores do vinhoto penetram no solo, poluindo o aquífero.

Assim, têm-se três questões ambientais importantes, segundo o docente: devastação das florestas, contaminação da água e, embora não se fale muito, a poluição do ar, provocada pelo impacto causado pela queima da palha da cana-de-açúcar na saúde. “Felizmente este tem sido um problema relativamente menor. Primeiro, por causa da pressão social e, segundo, pela vantagem econômica. Além de ser poluente, a queima da cana desperdiça material verde e o usineiro deixa de aproveitar o potencial energético proporcionado pela palha da cana. A partir do desenvolvimento de máquinas que enfardam a palha que fica no campo, atualmente é mais lucrativo para os produtores utilizar a palha para produzir energia elétrica, apesar de o corte de cana crua com máquina às vezes ser menos eficiente do que o corte da cana queimada" aponta o professor.

Há uma série de aspectos e detalhes que tornam a questão ambiental extremamente importante para a construção do Brasil que queremos viver. Não se pode mais atuar nesse país de forma ambientalmente irresponsável.


Fonte:AlcScens



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